quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O Controle que vem da Tela

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Olá, nobre visitante,

Hoje foi um dia bem puxado. Só consegui abrir o blog agora (23:15 h) para atualizá-lo.

Como não quero perder o padrão de atualização (quartas e domingos) encontrei um texto que escrevi há alguns anos em um boletim chamado Mídia Rebelde, produzido por um grupo de amigos e colegas da faculdade de jornalismo, e faço a postagem dele hoje aqui.

Espero que gostem. E até o próximo domingo.

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MUITO ALÉM DOS TELEJORNAIS


Por que os telejornais, de uma maneira geral, são tão parecidos, tanto na forma, quanto no conteúdo?

Se fizermos uma amostragem diária daqueles jornais podemos perceber, por exemplo, que poucas notícias e abordagens dos fatos do dia se diferenciam umas das outras. Temos assim a impressão de que a importância dos acontecimentos (e sua transformação em notícia) têm igual valor para todos os canais. Ou melhor esclarecendo, percebe-se que todos os canais de TV tem visões de mundo bastante parecidas, e assim pretendem repassá-la aos telespectadores.

Se no conteúdo as coisas são assim, na questão de formato as semelhanças são mais aviltantes. Todos os jornais têm seus blocos delineados de uma mesma forma, com as notícias sendo passadas rápida e superficialmente.

Esse modelo é tão sistêmico que podemos encontrar, por exemplo, no Manual de Assessoria da Câmara Federal a informação de que para um jornal de TV é “necessário” ao jornalista ser o mais “claro e conciso” possível, não sendo correto que o mesmo externe suas opiniões. Seguindo este procedimento padrão os telejornais têm dentro de seus blocos notícias de parcos 2 minutos, no máximo. Dentro de amostragem efetuada, em determinados dias, a média de tempo das notícias pode chegar a apenas 1 minuto!

Alguns especialistas da área de comunicação criticam violentamente este modelo de jornalismo. Pierre Bourdieu, sociólogo francês, no livro Sobre a Televisão, publicado no Brasil, criticou e atacou os jornalistas franceses por defenderem e aplicarem aquela visão de comunicação, fenômeno chamado por ele de “fast thinking”, o qual, segundo o próprio Bourdieu, faz com que os telespectadores se acostumem a receber informações sempre em blocos, rápida e descontextualizadamente, perdendo assim a capacidade de compreender os acontecimentos como elementos de um elo maior, e vendo a vida cada dia mais como apenas um “espetáculo” com fatos soltos e dispersos.

Em Salvador, se assistirmos ao Bahia Meio-Dia, Jornal da Manhã, Aratu Notícias, Página 1, entre outros, veremos que se diferenciam apenas pela qualidade técnica. Alguns pelo colorido mais bonito, ou pelas imagens sem riscos e sombras. Alguns deles com apresentadores impecáveis (com direito à maquiagem e tudo mais), até com ternos alugados de boas lojas. Câmeras digitais, som estéreo, etc...

Porém, e infelizmente, todos com o mesmo tratamento superficial e pobre dado às notícias, talvez com medo de que o espectador inicie, a partir de abordagens mais refinadas, um processo de reflexão, e se mobilize, em busca de mudanças muito além da TV.

Texto publicado em Mídia Rebelde, Março de 2006

Um comentário:

Anônimo disse...

«Os povos primitivos não conheciam a necessidade de dividir o tempo em filigranas. Para os antigos não existiam minutos ou segundos. Artistas como Stevenson ou Gauguin fugiram da Europa e aportaram em ilhas onde não havia relógios. Nem o carteiro nem o telefone apoquentavam Platão. Virgílio nunca precisou de correr para apanhar um comboio. Descartes perdeu-se em pensamentos nos canais de Amesterdão. Hoje, porém, os nossos movimentos são regidos por fracções exactas de tempo. Até mesmo a vigésima parte de um segundo começa a não mais ser irrelevante em certas áreas técnicas.»

Paul Valéry, in «A Busca da Inteligência»